Aumenta o abuso de bebida alcoólica durante a pandemia

Um levantamento publicado na revista Alcohol And Drug Review e realizado por um grupo internacional de pesquisadores do Brasil, Canadá, Estados Unidos e África do Sul, e da Organização Mundial de Saúde (OMS) e a Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS), mostra que em situações de pandemia não é incomum ocorrer aumento nos índices de alcoolismo, embora a diminuição da renda ou restrições na venda possa contribuir para a redução no consumo. Para chegar a esse levantamento o grupo estudou epidemias e surtos ocorridos anteriormente, como o da SARS, na África do Sul. Esse levantamento aconteceu em março, durante um encontro internacional pouco antes dos aeroportos europeus serem fechados em virtude da pandemia da Covid-19, o que levou o grupo discutir a necessidade de prever a tendência do consumo de álcool que ocorreria durante a quarentena.

No mês de abril a OMS chegou a emitir um comunicado pedindo aos governos que limitasse o acesso a bebidas alcoólicas, alertando que o abuso do álcool  durante o isolamento pode acarretar consequências graves, inclusive o aumento da violência doméstica. "É sabido que a regulamentação da comercialização é o que mais influencia o consumo de bebidas alcoólicas pelas populações”, declarou a pesquisadora e professora Zila Sanchez, da Escola Paulista de Medicina da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp) e coautora do estudo. De acordo com ela, várias pesquisas mostram que, depois de um evento como esse, há um aumento de dependentes de álcool na população. “As pessoas podem estar consumindo mais álcool agora para lidar com o estresse da situação, mas isso claramente pode seguir como uma dependência após a pandemia”, alertou.

Para o psiquiatra Arthur Guerra de Andrade, especialista em dependência química, e presidente executivo do Centro de Informações sobre Saúde e Álcool (CISA), se o consumo nocivo de álcool já era uma preocupação antes da quarentena, durante a pandemia, com o isolamento social, o aumento desse comportamento passa a ser ainda mais relevante. “Não somente pelos efeitos negativos do uso abusivo de álcool no sistema imunológico, em um momento que este deve ser fortalecido, mas também pelo fato de que esse hábito de beber mais pode trazer impactos a curto e longo prazo”.

 

 

Estudos mostram que o consumo de álcool tem influência negativa no sistema imune, tornando o organismo mais vulnerável a infecções por bactérias e vírus. Além disso, o álcool colabora para a ocorrência de depressão, ansiedade e violência doméstica, que podem ser mais frequentes durante o isolamento. O uso constante, descontrolado e progressivo de bebidas alcoólicas pode comprometer seriamente o bom funcionamento do organismo, levando a consequências irreversíveis, com prejuízos não apenas para a própria vida, mas impactando no ambiente familiar, e na vida profissional e social.

Segundo o psiquiatra,  uma recente pesquisa realizada no Brasil relatou que, quando associado à frequência de se sentir triste ou deprimido, o maior índice de crescimento (26%) foi entre as pessoas de 30 a 39 anos, e menor entre os idosos (11%). No geral, 18% dos participantes relataram aumento do consumo de álcool durante a quarentena. “Em tempos de pandemias esses sentimentos negativos, como ansiedade, tristeza e incertezas são mais frequentes, e o cenário torna-se ainda mais preocupante quando o álcool é consumido para lidar com isso”, explica o psiquiatra.

Embora aceito pela sociedade quando o uso é sociável, a bebida alcoólica pode oferecer uma série de perigos para a saúde, principalmente quando se instala o alcoolismo, caracterizado pelo consumo compulsivo e progressivo, tornando o usuário tolerante à intoxicação produzida pelo álcool, e desenvolvendo sinais e sintomas de abstinência. No Brasil, segundo dados do Ministério da Saúde, 17,9% da população adulta faz uso abusivo de bebida alcoólica.

 

Aumenta o índice entre mulheres 

De acordo com a publicação “Álcool e a Saúde dos Brasileiros – Panorama 2020”, produzida pelo CISA, aumentou o consumo abusivo de bebida alcoólica pela mulheres. A pesquisa Vigitel 2018, do Ministério da Saúde, mostra que, de 2010 a 2018, o índice de mulheres de 18 a 24 anos que exageram na bebida cresceu de 14,9% para 18%. Na faixa etária dos 35 aos 44 anos, esse índice passou de 10,9% para 14%.

 

 

Com relação à Bahia, a publicação da CISA registrou que entre 2010 e 2018 houve um aumento de 10% nos casos de internações atribuíveis ao álcool entre mulheres. E, em termos de óbitos relacionados ao consumo de álcool, também houve um crescimento entre as mulheres de 17,5%, maior até do que o observado entre os homens (de 14,3%). Já o Vigitel 2019, mostrou que Salvador lidera o ranking de frequência de abuso de álcool entre as mulheres (18,1%), seguido por Rio de Janeiro (17,6%) e Palmas (17,4%). “São dados que ressaltam nossa preocupação sobre o uso de álcool pelas mulheres, tendo em vista que elas são biologicamente mais vulneráveis aos efeitos do álcool que o homem. É um alerta relevante para políticas públicas que contemplem as mulheres no que se refere à prevenção do uso nocivo de álcool”, alerta o presidente executivo da CISA.

 

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Fonte consultada: Agência Fapesp (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo)